
O fetiche do lançamento: por que ainda tratamos o evento como o produto final?
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Em muitos times de produto, há uma tensão constante entre estratégia e espetáculo. É como se o valor de uma funcionalidade estivesse diretamente atrelado à quantidade de likes que ela gera no LinkedIn, ou à reação das lideranças durante o vídeo de lançamento.
A expectativa pelo “grande momento” se sobrepõe à essência do trabalho que deveria ser resolver problemas reais com consistência.
Um bom lançamento pode, sim, ser um marco. Ele tem poder de comunicação, ativa canais, engaja parceiros, impulsiona vendas e mobiliza o time. É o tipo de momento que une tecnologia, marketing, negócios e operação em uma mesma cadência.
O problema é quando o lançamento deixa de ser um meio para se tornar o fim.
Na prática, muitos ciclos de entrega estão sendo pautados por deadlines externos. Datas de eventos, reuniões com investidores, janelas de marketing... Nada contra datas. Ciclos são importantes. Mas quando a decisão de lançar parte do calendário, e não da maturidade da solução, entramos num território arriscado.
Funcionalidades inacabadas ou mal validadas vão para produção. O Product Discovery é comprimido em versões simplificadas, quando não completamente ignorado. E o que chega ao usuário final é um MVP desnutrido, lançado com pompa, mas sem tração.
A consequência disso é múltipla: baixa adoção, frustração de usuários, desgaste com o time comercial (que apostou no “lançamento”) e perda de credibilidade da área de produto. Quando o evento vira o foco, o valor real passa a ser secundário.
Vaidade organizacional disfarçada de inovação. Lançar algo “visualmente moderno”, que parece inovador, muitas vezes vale mais internamente do que resolver um problema técnico obscuro mas crítico. É o famoso "sinal de progresso", ainda que seja só maquiagem de backlog.
Benchmark sem contexto. A lógica do “o concorrente fez, precisamos fazer também” é uma das grandes sabotagens à estratégia de produto.
A ausência de uma narrativa clara de produto. Quando não há clareza sobre a dor que estamos resolvendo e para quem, qualquer funcionalidade vira “feature de evento”.
Quando o evento se torna o encerramento simbólico do esforço, vemos um padrão muito comum: o time desmobiliza. O projeto “encerrou”, o time volta para a fila de "prioridades", e a funcionalidade lançada não é evoluída nem sustentada.
Marketing fez campanha, vendas fez pitch, tech fez deploy. Mas ninguém cuidou do onboarding, do handoff para atendimento, do acompanhamento de métrica de sucesso. E o que foi construído vira uma “ilha de funcionalidade” isolada, esquecida e, muitas vezes, até descontinuada meses depois.
Isso gera um efeito colateral grave: cansaço do time, desalinhamento entre áreas, e uma distorção na percepção de valor construída em torno do produto.
Um bom lançamento deve marcar o início de um novo ciclo. Ele precisa estar conectado com o ciclo de vida do usuário, com a operação, com os dados de uso que virão depois. Ele exige preparação de equipe de suporte, documentação técnica, fluxos de marketing que mantenham a narrativa viva por semanas — não apenas no “dia D”.
Lançar algo que foi validado com usuários reais, em ambiente controlado, com dados qualitativos e quantitativos sustentando a decisão, muda completamente a percepção de quem trabalha e de quem consome. Um produto é tão bom quanto sua evolução contínua, não sua apresentação inicial.
Antes de colocar algo em um evento, é preciso garantir que aquilo tem hipótese validada e uso potencial comprovado.
A narrativa precisa ser clara, centrada em impacto, e não em quantidade de funcionalidades.
O time precisa saber que o evento não é o fim, mas o começo de uma etapa onde métricas.
Pessoas de vendas e marketing não têm tempo a perder com funcionalidades que não pegam. Desenvolvedores se frustram ao ver horas de engenharia aplicadas em features que são abandonadas depois do evento. Gerentes de produto queimam cartucho quando vendem “valor” que não se sustenta no uso real.